sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Recordar é Viver: "Inocêncio Martins, um grande meio-campista"







Por Wandeley `Tico´ Cassolla


Hoje a coluna fala um pouco da sofrida história do Inocêncio Martins, o Rabudinho, um dos grandes jogadores do varzeano garcense do passado. Nos anos 60/70, era um dos destaques nos gramados, hoje está acolhido pelo Lar dos Velhos “Frederico Ozanan” da cidade. Convivi um bom tempo com o Rabudinho no futebol e também fomos colegas de trabalho.

Lembro que ele jogava como meio campista. Tempos depois trabalhamos juntos numa instituição bancaria da cidade, ele no caixa, eu de office-boy. Mas as boas lembranças foram vividas no futebol. Dava gosto ver o Rabudinho jogar. Tinha um domínio espetacular da bola. Um camisa 10, sem ser canhoto, com ótima visão das jogadas. O seu estilo de jogo parecia com o Ademir da Guia, reconhecidamente como o melhor jogador da história do Palmeiras. No linguajar do futebol, “Rabudo” é o jogador que tem sorte para fazer jogadas de efeitos e marcar gols impossíveis.

Se fosse melhor visto e observado, tinha tudo para ser um atleta profissional, pois futebol era seu dom maior. Só que naqueles tempos era bem mais difícil do que hoje fazer carreira. Em Garça o Rabudinho jogou nos principais times: Paulistinha, Mercado, Rebelo, Serenata e o Ramos. Também se aventurou no suíço, defendendo o próprio time do Bradesco e o famoso Expressinho RCG. Uma curiosidade: nunca errou um pênalti, segundo o Bidiu, que jogou ao seu lado nos times citadinos. 

Veja o Rabudinho no time do Banco Induscomio. Em pé da esquerda para direita: Adecildo Alves, Agamenon, Cabrini, Marião, Béia e Mazzola; agachados: Zé Bituca, Rabudinho, Rogério Guanaes, Fontes e Sidney Sampaio.

Recordo que ele morava com sua mãe em Vila Rebelo. Paralelamente ao futebol trabalhava numa agência bancária no centro da cidade. Funcionário exemplar, com 10 ou mais anos de casa, estava em ascensão na carreira. Ocupava o cargo de caixa, e tinha um bom salário. Na época arrumou uma namorada, acho que era da região de Campinas. Ele ia de trem visitá-la praticamente todos os finais de semanas, ou um sim, outro não. O casamento sairia em breve, já estava comprando os móveis nas lojas da cidade. Nos mostrava feliz os carnês de pagamento, daqueles com 12, 18 ou mais prestações fixas. 

Até que chegou o fatídico dia, uma segunda feira, quando foi desligado (mandado embora) do banco. Costumeiramente, estávamos na improvisada cozinha na tradicional resenha, tomando café, junto dos colegas Zezão Lourenço, Kunio Matsuo, Mariscal, Herédia, Vicente, “Gordo” Moreti, Madeira, Titão Manflin, Kako, Armando Leal, Tiãozinho, Maria Santina, Laércio, Roberto Garcia, Kleber, Mamede, Osias, e alguns outros (no flagrante parte da turma), que a memória não lembra mais. 

O gerente Laerte Otaviani, chamou o Inocêncio até a mesa dele e deu a triste notícia “estava demitido, podia ir embora, e aguardar para fazer o acerto no sindicato”. Era uma política do banco, dispensar os funcionários mais antigos. Se nós, colegas de serviços, ficamos abalados, como teria ficado ele? Chegou até o seu caixa, pegou alguns documentos, entregou as chaves, ergueu as mãos e de cabeça baixa, deu um triste tchau. Foi embora. Talvez o caminho mais longo de sua vida, até chegar na calçada da Rua Barão do Rio Branco. Aquilo foi traumático por demais. 

Para se ter uma ideia do que isto lhe causou, o Inocêncio ficou por cerca de um ou dois meses, vindo diariamente na agência, mas não entrava, ficava em frente numa Loja de Discos (Musitape?) do sr. Luiz Sganzerla, olhando para o banco. Praticamente passava o dia todo ali. Uma cena que sempre vem a minha memória: nós trabalhando, e o Inocêncio lá fora em pé, fazendo não sei o quê. 

Talvez aguardando ser recontratado?. O que deveria passar em sua cabeça? Com a idade avançando, já nem bola jogava mais, seu grande divertimento. Na mesma época, outro duro golpe: perdeu a namorada (talvez a única, pois era um tanto quanto tímido) e o casamento, com a casa praticamente montada. Tempos depois, foi a vez de perder a sua querida mãe. Passou a morar sozinho na casa em Vila Rebelo.

Alguns amigos tentaram lhe ajudar, oferecendo emprego, lembro do Mario Tomita e do Roberto Garcia, que tinham escritório de contabilidade. O Inocêncio tentou trabalhar, mas com os duros golpes sofridos, a saúde ficou abalada. Não reunia mais condições de exercer uma atividade útil. Um irmão dele ainda o levou para Tupã. Não se adaptou, retornou para Garça”. Sozinho, foi acolhido pelo Lar dos Idosos, onde hoje vive feliz e é querido por todos.