terça-feira, 3 de abril de 2012

"Ilegalidade gritante" faz procurador ameaçar financiamento do 'Itaquerão' com ação na Justiça


O procurador da República José Roberto Pimenta considera “uma ilegalidade gritante” o sigilo bancário defendido pelo Banco do Brasil para não divulgar detalhes do financiamento da arena do Corinthians. Pimenta vai enviar outro ofício ao banco nesta quarta-feira, dando prazo de até cinco dias úteis para receber as informações.
“Depois disso, vou ingressar com uma ação civil pública porque estamos diante de uma ilegalidademanifesta: o dinheiro é público e não cabe sigilo bancário nessa operação junto ao BNDES”, disse o procurador da República.
Sexta-feira, o BB informou o procurador que não iria repassar informações comerciais do contrato assinado com a construtora Odebrecht, para obtenção de R$ 400 milhões junto ao BNDES.
O procurador sentiu o golpe, mas se arrumou para uma batalha ainda mais longa, se for preciso.
“Dois pontos são importantes para o Ministério Público Federal nesse momento:  como será feita a intermediação desse empréstimo e que garantias serão oferecidas ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social paro o financiamento”.
Um analista financeiro de Brasília, que acompanha as operações entre o BB e a Odebrecht, revelou ao UOL que “o Banco do Brasil até torce para que a Justiça quebre o sigilo da operação”.
“O BB fez um contrato com sigilo porque é o que determina a lei, mas não há problema algum com essa operação”, garantiu a fonte. “A quebra de sigilo desobrigaria o banco a manter o compromisso firmado, em contrato, com a cliente Odebrecht”, concluiu analista.
O MPF quer saber os detalhes da operação financeira que colocou o Banco do Brasil como intermediário e garantidor de um empréstimo de R$ 400 milhões para construção do Itaquerão.
O Banco do Brasil e a Odebrecht serão os donos do estádio até a quitação de R$ 730 milhões (R$ 400 milhões mais R$ 330 milhões de  juros) por parte do Corinthians, supostamente em 2027 – caso o contrato seja mesmo assinado em junho de 2012.
 A construtora e o banco são cotistas de um fundo de investimento imobiliário criado pelo BB. Este fundo será o dono da nova arena nos próximos 15 anos.
O BB se nega a fornecer detalhes dessa operação e cita a Lei Complementar 105/2001 como escudo jurídico.  
“O cliente não vai fazer uso do sigilo bancário porque essa operação é feita com dinheiro público, patrimônio total da União”, indignou-se o procurador  do MPF de São Paulo, José Roberto Pimenta.
Oficialmente, o banco admite revelar os detalhes do contrato de financiamento firmado com a Odebrecht, em duas situações: ordem da Justiça Federal ou autorização da Odebrecht.
Em nota enviada ao UOL o banco responde à pressão do MPF/SP:
"Em relação a (sic) informações divulgadas nesta data pelo MPF em São Paulo, o Banco do Brasil esclarece que os dados de suas operações comerciais estão protegidos por sigilo bancário, ressalvadas decisões judiciais em contrário ou autorização do cliente, conforme previsto na Lei Complementar 105/2001.
O Banco do Brasil esclarece ainda que não possui relação comercial com o Sport Clube Corinthians e que não é tomador de empréstimos junto ao BNDES, para o que existe restrição legal”.
O MPF quer informações para analisar a participação do BB como garantidor e intermediário de empréstimo junto ao BNDES.
Como o BNDES não contrata empréstimo diretamente com clientes privados (Odebrecht) nem com clubes de futebol, há a necessidade de intermediação deum banco do sistema financeiro de varejo, que faça o repasse dos R$ 400  milhões. Esse papel caberá ao BB, que também aceitará as garantias oferecidas pela Odebrecht Participações.
A Odebrecht Participações cria engenharia financeira para que a construtora da holding finque estacas e conclua os projetos. O MPF quer saber quem está oferecendo as garantias reais (no valor de R$ 520 milhões) e se o capital estatal (BNDES) está correndo algum tipo de risco.
O financiamento pedido ao BNDES no valor de R$ 400 milhões ajudará a construtora Odebrecht a tocar a obra do estádio que deve abrir a Copa 2014, em São Paulo.
No total, o custo do estádio está orçado em R$ 820 milhões, fora despesas com taxa de risco, repasse (via Banco do Brasil), juros, remoção dos dutos da Petrobras e assentos móveis.
 Além dos R$ 400 milhões financiados pelo BNDES, a construtora ainda necessita de mais R$ 420 milhões, parcela a ser captada com a venda de títulos emitidos pela Prefeitura de São Paulo(CIDs).
Ao Corinthians caberá o pagamento do financiamento em 15 anos junto ao BNDES. Com juros e taxas de risco, o clube devera quitar até 2027 o equivalente a cerca de R$ 730 milhões (sem correção monetária).
Na última sexta-feira, a Odebrecht divulgou nota confirmando que o BB havia liberado um empréstimo-ponte de R$ 150 milhões, até que seja aprovado o financiamento do BNDES.  
Por ponte entende-se que a construtora terá uma “parcela de adiantamento” dos R$ 400 milhões oferecidos pelo BNDES, até que o contrato seja assinado. Na verdade, será a segunda parcela-ponte. A primeira, de R$ 100  milhões foi liberada em dezembro de 2011 pelo banco Santander.
Os dois empréstimos-ponte não foram concedidos pelo BNDES e os juros operacionais e as taxas de risco devem ser bem mais altos. Uma obra como o Itaquerão consome cerca de R$ 300 milhões ao ano, até sua conclusão em dezembro 2013.
Por Roberto Pereira de Souza - UOL/São Paulo