sábado, 1 de junho de 2013

Uma singela homenagem a um ex-aluno de muito sucesso

O querido Angelo Martins Jr, direto de Londres

Time campeão regional mirim escolar do CSA/Objetivo, ano 2000; Juninho é o segundo agachado, da esquerda para a direita

Infantil, campeão da extinta Associação de Basquetebol do Oeste Paulista, ano de 2001; o sociólogo garcense é o penúltimo agachado, da esquerda para a direita
Angelo Martins Jr. mereceu uma grande matéria na edição deste sábado (1º) do jornal Comarca de Garça. O sociólogo garcense, hoje em Londres, colhe os frutos de sua dedicação aos estudos, fazendo seu doutorado.
Para mim ele foi o Juninho, querido aluno do CSA/Objetivo e atleta do basquetebol garcense, onde conseguiu relativo sucesso. Nascido em 1986, fez parte de uma geração vencedora, que deixou muita saudade, principalmente neste blogueiro, que por 20 anos ininterruptos, esteve comandando o basquetebol garcense. Abaixo, reproduzo a matéria do JCG, com muito orgulho e desejando cada vez mais sucesso ao querido Juninho ´Gabiru´:

ORGULHO - Sociólogo garcense faz doutorado em Londres e terá livro sobre imigração publicado na Inglaterra

Mudar de país para mudar de vida. Essa é uma das visões mais comuns que todos temos dos migrantes e imigrantes. Desde os tempos das grandes navegações e do colonialismo, pessoas, famílias e até povos inteiros passaram a mudar de território em busca de chances para melhorar as condições de vida, dar um futuro mais digno às suas próximas gerações.

O sociólogo Ângelo durante apresentação de seu trabalho em Cambridge-ING
Esse retrato que se solidificou ao longo dos anos vem mudando um pouco de cara. Nem sempre uma pessoa hoje migra para conseguir mais dinheiro. Atualmente há quem mude de país em busca de conhecer outras culturas, aprimorar o idioma, pelo gosto pelo “desconhecido”, ou até para fugir de situações desconfortáveis em sua terra natal.

Assim, observando e anotando os diversos motivos de alguns “cidadãos do mundo” que o garcense Ângelo Martins Junior está prestes a lançar um interessante livro sobre essa questão, especificamente sobre o imigrante brasileiro na Inglaterra. O que antes era material acadêmico, está se transformando em uma obra a ser traduzida não só para o inglês, mas para outras línguas.

Ângelo, que também é um imigrante – foi para o exterior pela primeira vez em 2008 -, tinha o intuito de aprimorar seu inglês em Londres, e guardar um dinheiro para circular pela Europa. Porém, segundo ele, sua experiência foi mudando, ao notar a quantidade de compatriotas vivendo na capital inglesa, e as suas razões para estarem lá.

Aos 27 anos, graduado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Carlos, mestre em Sociologia (pela mesma instituição) e agora doutorando pelo Departamento de Sociologia do Goldsmiths College - University of London, o garcense conta que seu interesse pela área de Sociologia (que permeia toda sua obra), vem desde os tempos de colegial, aqui em Garça, influenciado por um professor de História.

Aliás, Ângelo credita muito de sua bagagem à educação que teve na cidade: “Estudei em diferentes escolas em Garça. Cursei o ensino básico no João Crisóstomo, depois cursei a quinta e a sexta séries no Hilmar Machado. No CSA Objetivo cursei da sétima série ao primeiro colegial, concluindo meus estudos depois no Lúmen (segundo e terceiro colegial). Foi no Colégio Lúmen que surgiu o interesse pela Sociologia, pois além de eles oferecerem a matéria para o colegial, eu tive um professor de História que era sociólogo, e nós sempre conversávamos sobre a profissão”.

Hoje Ângelo tem seus estudos voltados à Sociologia do Trabalho e Sociologia Econômica, levantando questões como o mercado de trabalho, mobilidade, industrialização, temas que estão dentro das pesquisas desenvolvidas pelo Grupo de Estudo Trabalho e Mobilidade (UFSCar), do qual faz parte desde 2006 e é coordenado pelo pesquisador professor Dr. Jacob Lima.

De Garça para uma das maiores capitais do mundo

Para estudar fora o caminho é duro. É preciso batalhar por bolsas e ir atrás de instituições que abram as portas para determinadas pesquisas: “Em 2010, iniciei o meu mestrado no Brasil, abordando o tema ‘Brasileiros que vivem em Londres’. Eu já tinha a intenção de continuar com o mesmo tema durante meu doutorado, porém, eu queria fazê-lo na Inglaterra, tanto pela proximidade com o meu campo de estudo, quanto pela experiência de poder estudar em uma instituição inglesa. Comecei a pesquisar sobre instituições na Inglaterra que tinham pesquisadores desenvolvendo trabalhos na área de migrações, procurei por órgãos fomentadores de pesquisa, no Brasil e no exterior, que forneciam bolsas de doutorado. Fiz a inscrição no programa de Doutorado em três universidades inglesas, e iniciei o processo para conseguir uma bolsa de estudo da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superios/Brasil). Fui aceito nas universidades e consegui a bolsa da Capes, optando pela Universidade de Londres”, conta o garcense.

Para ele esses passos são grandes conquistas, tendo em vista que não é fácil sair de uma cidade pequena do interior e partir para uma das principais capitais do mundo: “Olha, eu ainda estou construindo a minha carreira, mas não posso negar que as conquistas que consegui, até então, não sejam valiosas. O fato de sair de uma pequena cidade como Garça, não pertencer a uma família da elite, fazer doutorado no Reino Unido, e ter um livro publicado na Europa, com 27 anos, é algo a ser festejado. Acho que essa minha trajetória é resultado de uma confluência de diversos fatores. Com certeza um desses fatores está diretamente ligado com o fato de eu ter crescido em Garça, uma cidade pequena, porém, com uma boa situação econômica e com boas instituições de ensino que permitem acesso à boa educação não somente àqueles que pertencem às classes altas”.

Para ele, o tamanho da cidade e o fato de muita gente se conhecer e manter um vínculo de amizade favorece na questão da educação: “Garça possibilita um contato maior entre as classes sociais, pessoas de classe mais baixas conseguem bolsas e descontos nas escolas locais, como aconteceu comigo. Eu fiz inglês no Fisk e estudei no CSA e no Lúmen sempre pagando menos do que o valor integral. Lógico que junto com isso vem a dedicação aos estudos, as pessoas importantes que encontrei ao longo da minha trajetória acadêmica, como meus amigos Prof. Jacob (UFSCar) e Prof. Attila Barbosa (UFPel)”.

Deste modo, Ângelo sentiu as principais diferenças entre uma cidade brasileira e uma capital europeia, seu modo de vida, o pensamento das pessoas, o ritmo de cada lugar. E assim pôde fazer as primeiras observações para seu futuro trabalho: “Essa é a terceira vez que estou morando em Londres. Eu já havia morado aqui por quase um ano, entre 2008 e 2009, quando vim para melhorar meu inglês e ter uma experiência fora do país. Depois retornei em 2011, somente por três meses, para entrevistar o pessoal para a minha pesquisa de mestrado. Retornei, dessa vez, em setembro do ano passado. A experiência tem sido muito boa. Londres é uma cidade fascinante, com uma vida cultural muito ativa. A cada dia você é surpreendido por algum lugar que ainda não conhecia, sem mencionar o estilo de vida leve que é possível levar aqui. É sempre bom poder andar pelas ruas sem se preocupar com grandes violências e ter um sistema de transporte público de qualidade, onde andar de ônibus/metro não é estigmatizado pela população como ‘coisa de pobre’, como, infelizmente, acontece nos grandes centros de nosso país. É claro que toda a infraestrutura que eles possuem aqui - que não podemos esquecer que grande parte é resultado de anos e anos de exploração nas colônias britânicas - faz com que a população opte por usar o transporte público. Contudo, a relação com o carro - e outros bens de consumo como roupas etc. - é culturalmente vista pelo pessoal por aqui de uma maneira diferente do modelo brasileiro. Se você não tem um carro no Brasil, você não é ninguém”.

Mas o doutorando também destaca que apesar da “cabeça mais aberta” dos britânicos e de seu modo de vida mais prático, o conhecido perfil mais “frio” também pode atrapalhar um pouco a interação com os demais povos: “A questão do clima e a forma como se desenvolvem as relações pessoais são fatores que sempre pesam para os brasileiros que estão aqui, no geral. O forte inverno e a falta de amizades mais profundas são sempre discutidos por aqui. O clima brasileiro é muito bom, e sempre faz falta, além disso, sempre bate uma saudade do nosso país e das pessoas que amamos e ficaram para trás”.

Por outro lado, o garcense lembra que os europeus respeitam muito os estrangeiros que vão para lá em busca de aprimoramento acadêmico e cultural. A visão do pobre imigrante desempregado que vai a outro país em busca de emprego já tem mudado um pouco. Claro que ser imigrante, seja onde for, ainda não é uma situação tão confortável, ainda mais em tempos de crise atravessada pela Europa, mas o pesquisador e o estudante são bem recebidos porque também levam investimentos aos países. Além disso, o Brasil, aos olhos do mundo, vem tomando importância econômica e ganhando um pouco mais de respeito lá fora.

“O fato do Brasil ser tido como o país do futuro acaba capitalizando, simbolicamente, o brasileiro que mora no exterior. Mesmo amigos que moram em Portugal (inclusive uma delas é outra garcense, Amanda Guerreiro, que estuda imigrantes brasileiros em Portugal), local onde historicamente a relação com brasileiros não é tão amigável, relatam que o brasileiro está tendo uma receptividade um pouco melhor”.

E foi a partir desta constatação que Ângelo deu início aos seus estudos: “Eu me assustei quando vi o tanto de brasileiros que viviam em Londres. Estima-se que há entre 130.000 e 160.000 brasileiros morando na capital inglesa, e os motivos para a migração nem sempre se resumem a questões econômicas, ideia fortemente presente no imaginário da população, e da mídia, em geral. O migrante, em nosso imaginário, é sempre tido como o sujeito pobre que se desloca para uma região mais desenvolvida em busca de trabalho. Mas quando você passa a viver como um imigrante, ou desenvolver pesquisas a respeito, esses estereótipos e generalizações passam a ficar frouxos ou não fazem mais tanto sentido. Por exemplo, é muito comum você encontrar mulheres, pertencentes á classe média brasileira, que migrar foi uma maneira de ‘fugir’ de expectativas e pressões familiares, as quais, no caso brasileiro, são fortemente machistas e sexistas. Muitas mulheres largaram bons empregos no Brasil com a desculpa de ficar em Londres por um ano para aprender em inglês, e estão aqui por mais de dez anos, porque elas não aguentavam mais as pressões, especialmente dentro de casa, para se enquadrarem no que é esperado da mulher: ser uma prendada e ‘comportada’ para poder encontrar um bom (e se possível afortunado) marido e ser uma boa esposa”.

“É um livro que retrata vidas em movimento, a vida de um imigrante”

Vendo toda essa nova realidade, Ângelo teve a ideia de desenvolver uma pesquisa sobre brasileiros em Londres: “Comecei a fazer um ‘caderno de campo’, que é uma espécie de diário no qual você relata suas experiências e daqueles ao seu redor, sobre seu dia a dia como imigrante. Quando eu retornei ao Brasil, apresentei esses dados ao meu orientador na UFSCar e desenvolvi minha dissertação acerca do tema”.

E foram essas anotações que deram origem ao livro que está sendo publicado, “Lives in Motion: notebooks of an immigrant in London”, que conta sua história como um imigrante e a de outras pessoas entrevistadas, recordando com eram suas vidas antes no Brasil, suas razões para a mudança, o processo de adaptação, a busca por emprego, problemas com a ilegalidade. “Enfim, é um livro que retrata vidas em movimento, a vida de um imigrante”, resume o autor.

O interesse pela publicação partiu da banca examinadora de sua dissertação. Quando os examinadores indicam um trabalho para virar livro, o autor tem que procurar por uma editora acadêmica e por financiamento, além de brigar por um espaço: “Eu estava iniciando esse processo, contudo, eu já havia traduzido a minha dissertação para inglês e tinha ideia de tentar algo por aqui. Um dia, em uma palestra em Londres, eu estava apresentando o meu trabalho e duas editoras ficaram interessadas em lê-lo. Uma editora inglesa, sediada na Dinamarca, ofereceu um contrato para publicar o livro em inglês. Eu fechei com eles, pois, como diz meu orientador Jacob Lima, escrever em inglês é escrever para o mundo”, conta o garcense.

Ele ainda lembra que a publicação no Brasil vai depender da demanda. Os direitos autorais pertencem à editora e ela tem que sentir que o Brasil vai querer ter essa obra, que os leitores brasileiros se interessam: “Como tudo nesse mundo é business, para tal eu preciso ter pedidos chegando do Brasil, assim a editora percebe que há um mercado para o livro em português. Portanto, amigos garcenses: uni-vos, e façam pedidos no site da editora ou no Waterstone, Amazon (risos)”, recomenda o escritor.

Garça também é digna de estudo, diz sociólogo 

Mesmo tendo vivido experiências marcantes fora do país, Ângelo lembra-se respeitosamente de Garça e destaca que a cidade também é digna de um estudo sobre sua estrutura social, econômica e histórica, especialmente depois que o município abriu mão da monocultura (arriscada) do café e assumiu uma outra face, a industrial: “Não podemos negar que a saída de Garça da dependência da economia cafeeira para a formação de um polo em eletroeletrônica e segurança permitiu a mobilidade social de diversas famílias nos últimos anos. Para ser sincero, Garça merece um estudo histórico ecônomico-social para analisar como o advento da industrialização diversifica uma economia local e muda toda a estrutura de uma cidade. Eu vejo algumas empresas, como a antiga Portal (que mais tarde virou a PPA e ISSEL) como uma das responsáveis por esse processo. Diversas médias e pequenas empresas foram abertas a partir da formação da PPA, e muitas se tornaram grandes empresas, como a RCG, Garen, ECP. Sem contar todas as pequenas e microempresas que passaram a existir para alimentar essas empresas maiores. Isso gerou um boom na cidade, com mais gente trabalhando e consumindo, dinamizando setores como o de comércio e de serviço. Não é por menos que você consegue ver o forte crescimento de alguns setores de serviço considerados como não ‘básicos’, ou ‘supérfluos’, como o ramo de piscinas, caso que pode ser bem exemplificado pelo trabalho desenvolvido pela família Sonsin Piscinas, tão conhecida na cidade.

Particularmente, a minha família foi também beneficiada por esse processo, quando meu pai e meus irmãos abriram a transportadora que hoje é a 3A Express. Isso permitiu que meus pais - que são quem de fato têm maior influência em minha trajetória por sempre investirem em meus estudos - pudessem pagar escolas particulares. As escolas também se beneficiaram desse crescimento econômico, podendo investir na infraestrutura e no quadro de professores”, relembra o pesquisador.

Sobre seus planos, Ângelo diz que tem que voltar ao Brasil, ficar aqui pelo menos pelo mesmo tempo que permaneceu fora, já que conta com o auxílio da bolsa do governo brasileiro.

Em relação ao doutorado, Ângelo escreve sobre as relações dentro da própria comunidade brasileira em Londres, ao estudar as diferenças entre classes sociais e regiões de origem, por exemplo, e como eles se relacionam entre si e com a cidade. Mas suas opções são muitas, a escolher: “Depois disso não sei, eu amo fazer pesquisa, ensinar e escrever, então provavelmente seguirei na carreira acadêmica. Não sei onde ainda. Eu amo meu país, mas não vejo problemas em ir morar em outros lugares depois. No mundo líquido e móvel que vivemos hoje, fica muito difícil fazer planos. Vivemos em um presente permanente, desenvolvendo projetos com tempo previamente determinado, quando acaba um projeto temos que nos envolver em outros e assim por diante. Portanto, agora penso somente em terminar o doutorado e retornar ao Brasil”.

Para finalizar, o doutorando não poderia deixar de fazer seus agradecimentos às pessoas que colaboraram com sua trajetória: “É sempre bom fazer alguns agradecimentos públicos quando temos oportunidade, não?! (risos) Gostaria de agradecer meus pais, Seu Ângelo e a Dona Leo, meus familiares e a todos os amigos que tenho o imenso prazer em dizer que tenho sempre eles ao meu lado, independente da distância”.  

Fonte: Jornal Comarca de Garça